Paulo Araújo
Motociclista, jornalista e comentador desportivo
OPINIÃO
Jerez de la Frontera: Destino obrigatório
Jerez de la Frontera... a simples menção da localização do Grande Prémio de Espanha conjura imediatamente imagens na mente de cada um que já lá tenha estado... o país vizinho pode ser a maior nação do mundo em termos de motociclismo, com vários circuitos a receberem o Mundial, mas G.P. de Espanha há só um...
andardemoto.pt @ 3-5-2017 10:54:59 - Paulo Araújo
Em parte é o encanto da Andaluzia... os cavalos, as adegas, o sol, mais de 30.000 motos a circular por todo o lado, Puerto de Santa Maria com o marisco e a cerveja... e nem um quarto de hotel livre num raio de 30 Km.
Mas o GP de Espanha é o Grande Prémio de referência, a marcar, como acontece este ano, o regresso da caravana à Europa, o que aliado à magia natural da região o tornam atractivo, irresistível mesmo, para dezenas de milhares de Portugueses...
Nos anos 90, antes de haver GP de Portugal, Jerez fazia as vezes dele, ocasionando
uma romaria imperdível de grupos tão díspares como os das race-replicas, os
homens da velha guarda que lá tiravam o pó às máquinas, os das Gold-Wing, que
viajam com esposa, lavatório e armário da loiça atrás se preciso fosse, os das
turísticas, e até uns pozinhos de juventude aventureira montados no que
conseguiam arranjar, frequentemente Yamahas DT125 bem usadas, mas prontas para
tudo...
Tudo contribuía para a excitação em redor da peregrinação:
Semanas antes, o comércio das duas rodas beneficiava de um marcado incremento,
com centenas de donos a escolher (ou mais propriamente, à portuguesa, a adiar
para o último minuto possível) a altura para mudar o óleo, colocar um pneu, uma corrente,
pastilhas novas... exclusivamente para poder ir a Jerez.
Marcar oficina nas duas semanas antes era coisa que só os incautos tentavam, normalmente para serem recusados “até depois de Jerez”. Depois, o planeamento da viagem em si – sim, porque para os “motards de café”, ir a Jerez de la Frontera era considerado uma viagem – dava pano para mangas.
Bem tijolado, podiam extrair-se uns quantos almoços e/ou jantares de convívio, com o pretexto de organizar a "viagem" e de ver quem era mais por ir por Elvas e Jerez de los Caballeros – a estrada em si já o pretexto para uns bons picanços e uma antecipação das delícias de um Grande Prémio – ou pela rota mais nacional, descendo até ao Algarve e entrando em Espanha só por Huelva.
A
chegada, dependia de quem já tinha bilhete comprado, hotel marcado, ou ia à
aventura para determinar o que se fazia a seguir. Para alguns, acampar era a
melhor opção, não só conseguindo ficar perto do Circuito, como inseridos no
ambiente cosmopolita de milhares de outros Europeus.
Frequentemente, o fim de semana acabava por ser curto para tanta coisa, e ao escolher entre o ambiente de Puerto de Santa Maria com os amigos, e as corridas vistas atrás de uma rede e que pouco diziam à maioria pois não havia portugueses nas grelhas, a parte desportiva perdia frequentemente para a parte lúdica e muitos acabavam por nem pôr o pé no circuito...
Os mais afortunados, com ligações a marcas ou sponsors, sacavam um “paddock pass” e aí sim, antes da ditadura de Ezpeleta tornar tudo tão difícil, circulavam entre as boxes e os camiões, cravando autógrafos e fotos com as “chicas” e, de vez em quando, apanhando até um ou outro piloto em circulação.
Tudo histórias para preencher as tertúlias
muitas semanas após o regresso, como eram também, invariavelmente, as sagas de
infortúnio: da árvore que de repente saltou para o caminho, ou da rotunda que
magicamente se tornou mais apertada...
Mais engraçado que tudo, acreditem que é verdade, eram os
que, chegada a hora da corrida principal, das 500, olhavam para o relógio e
diziam: “Bom, vou-me por a andar para evitar a confusão” – “Epá e a corrida?”
–“A corrida vejo em casa, deixei a gravar!”
Qualquer coisa como ir a um
restaurante, comer as azeitonas e quando chega o bife à mesa, bazar... enfim,
essa multiplicidade de maneiras de ver o "nosso" desporto era, justamente, uma das
suas atracções; o facto de os novos, e os velhos, homens e mulheres, os mais
abastados que tiravam a MV Agusta da garagem uma vez por ano ou os mais
remediados que iam de XJ Diversion com o pneu no limite do desgaste, todos
sentiam aquela necessidade de dizer: “Eu fui a Jerez!”
Agora, com os hábitos bem mudados, temos em Miguel Oliveira um português na grelha, não só a fazer número, mas perfeitamente capaz de fazer os nossos corações bater forte e dar saltos, um português capaz de ganhar!
E é capaz de ser mesmo desta!
Vemo-nos
lá?
andardemoto.pt @ 3-5-2017 10:54:59 - Paulo Araújo
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