Paulo Araújo
Motociclista, jornalista e comentador desportivo
OPINIÃO
Regresso às origens nas SBK
O regresso do Mundial de SBK a Donington, este fim de semana, dá o mote para recordar as origens do Campeonato, há 30 anos...
andardemoto.pt @ 23-5-2017 22:26:19 - Paulo Araújo
Durante mais de uma década, entre 1984 e 1995, quem quisesse
encontrar-me no fim de semana de Páscoa teria de rumar a Leicestershire
em Inglaterra, mais precisamente a Donington Park, onde eu seguia de perto
os campeonatos de duas rodas sempre presentes nessa ocasião.
Foi assim que, a 3 de Abril de 1988, parece agora há uma eternidade, estive presente no arranque do Mundial de Superbikes, nas primeiríssimas duas corridas do Campeonato que agora conhecemos.
Na altura, assistiu-se a um grande duelo entre Marco Luchinnelli na Ducati 851 e Davide Tardozzi (sim, o actual manager da Ducati em MotoGP) na Bimota.
Ainda não se tinha firmado o conceito de duas corridas independentes, e o vencedor do dia era o piloto que saísse com mais pontos no agregado, no caso Luchinnelli. Mas no pódio com ele estiveram estrelas como Joey Dunlop e o futuro bi-campeão inaugural das séries, o Californiano Fred Merkel.
Se o regulamento original carecia de algum polimento, já o conceito
básico, de competir com motos baseadas de perto nas desportivas
utilizadas diariamente, a chamada Fórmula Silhueta, sempre me pareceu
uma boa ideia.
De facto, deu origem à evolução acelerada da espécie, mas houve quem levasse muito tempo (alguns, até aos nossos dias) a dar-se conta da importância do primeiro Campeonato Mundial verdadeiramente global de desporto motorizado que tinha início há umas boas dezenas de anos a essa parte.
O primeiro Campeonato Mundial de desporto motorizado pode considerar-se que foi o Mundial de Velocidade em moto, o actual MotoGP, instituído em 1949. Para não ficar atrás, a FIA regulou a Formula 1 em 1950, ou seja, apenas na época seguinte.
Se descontarmos o arranque viúvo dos Turismos em 1987, com um WTCC que não regressaria permanentemente senão em 2005, e deixarmos de lado o empolgante Mundial de Resistência moto, iniciado em 1980, mas que ainda hoje luta por um verdadeiro estatuto global, contando apenas com as 8 Horas de Suzuka fora da Europa, só o seu homólogo campeonato das 4 rodas, o WEC, que data de 1964, se interpõe entre 1950 e o começo das SBK em 1988.
De um começo pouco mediatizado (a primeira empresa detentora dos direitos, a Sports Marketing, chegou mesmo a falir) a SBK profissionalizou-se por alturas de 1995 e chegou a bater a MotoGP em audiências nos anos 2007/2009, justamente quando se criou o Circuito de Portimão, que este ano recebe as SBK em Setembro.
Na altura, o Campeonato foi adquirido à falida Sports Marketing, com certeza por tuta e meia, pelos irmãos Flammini, que nem sequer acharam de grande interesse ocuparem-se dele até 1991, encarregando disso um “velho” manager da cena, o Belga Francis Batta, e a sua esposa Patricia Dethor, ambos fundadores da equipa Alstare em 1991.
A Alstare de Batta, que geria equipas e pilotos com grande sucesso nos Mundiais de Supersport, com Pirovano e Chambon em 98 e 99, de Superbike em 2005, com Corser e a Suzuki, e a entrada de Biaggi nas SBK, o regresso da Bimota de forma oficial há três anos, etc.) conseguiu patrocinadores como a Diesel ou a Corona e, basicamente, elevou o Campeonato do Mundo de SBK a um nível em que valia a pena à “holding” italiana tomar conta dele, vendendo-o pouco depois à InFront, que acabou por o vender à Dorna em 2013.
Isto tudo são coisas que, seguramente passam ao lado da vasta maioria dos fans, Mas foi importante, do ponto de vista desportivo, as fábricas entrarem mesmo a sério: primeiro a Ducati e a Bimota, depois timidamente a Kawasaki com aquela equipa Shinetsu de Aaron Slight e Rob Phillis, e logo a seguir, com os Americanos da Muzzi ao barulho, Scott Russell conquistou o campeonato no Estoril em 1993.
Para ilustrar a pouca importância dada ao campeonato na altura, nesses dias estive a almoçar com ele no McDonalds do Cascaishopping em perfeito anonimato...Seguiu-se a entrada oficial da Yamaha, com Edwards e Nagai em 1995, e logo praticamente todas as outras: A Honda envolveu-se mais uma vez, chegando a contratar Fogarty, que não se deu, nem com a RC45, nem com o estilo de gestão de Neil Tuxworth (dizia-me Fogarty a dada altura: “um memorando com que roupa vestir para o jantar de sexta feira, que camisa usar no Sábado, estás a brincar? Na Ducati, éramos uma família!”). A marca do H alado só voltaria a conhecer novamente o sucesso com Kocinsky e, claro, mais tarde ainda, com os dois títulos de Edwards em 2000 e 2002.
Muitos dizem que, com a profissionalização, se perdeu o verdadeiro espírito das SBK; mas o mesmo se dizia dos Grandes Prémios, 15 anos antes.
Nos anos 80, a minha credenciação para o Grande Prémio de Inglaterra consistia em aparecer, assinar o livro, (“Hello John – Hello mate, how are you?”) receber um saquinho de brindes da Shell (alguns ainda tenho!) e ir para a pista ou paddock fotografar aonde e como quisesse. Agora inventaram passes que perdem a validade Domingo de manhã e o "paddock" é um feudo fechado de um punhado de Ingleses, Italianos e Espanhóis!!
É utopia pretender que um Campeonato, para crescer e vencer, possa permanecer gerido em termos amadores... a profissionalização era inevitável. Com 6 equipas de fábrica e os privados efectivamente excluídos, à partida, de acabar mais alto que o “top 6”, perdeu-se algum do fascínio das séries... ganhou-se, isso sim, na evolução das motos de estrada, que nunca estiveram tão boas!andardemoto.pt @ 23-5-2017 22:26:19 - Paulo Araújo
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