Motos a hidrogénio?

O hidrogénio continua a ser referido como uma solução para a questão das emissões de carbono. Mas será que o elemento mais comum do universo vai eventualmente poder vir a propulsionar as nossas motos?

andardemoto.pt @ 21-9-2024 16:46:50 - Texto: Rogério Carmo

Até há poucos anos, o hidrogénio era apenas usado na indústria. Os fertilizantes consumiam mais de metade da sua produção, seguindo-se a refinação e produção de combustíveis que, em conjunto, consumiam mais cerca de 35% da produção.

Com o advento da pilha de combustível, o hidrogénio começou a chegar às notícias pela sua capacidade de, em conjunto com o oxigénio da atmosfera, produzir electricidade através de um processo químico cujo resíduo é apenas água pura, criando expectativa no que respeita à autonomia dos veículos elétricos, pois criar electrões em andamento é o Santo Graal da mobilidade elétrica.

Mas as células de combustível ainda têm uma longevidade questionável, sendo também muito caras de fabricar, requerendo metais nobres, platina, cobalto, níquel, paládio e um metal raro, o Lantânio (La), além de um hidrogénio muito mais puro do que o normalmente disponível.

Mais recentemente o hidrogénio começou também a ser falado como combustível para os convencionais motores de combustão interna, requerendo apenas pequenas modificações na alimentação. A sua estrutura molecular não integra carbono, pelo que resulta numa combustão isenta de monóxido ou dióxido de carbono, mas no entanto regista emissões de oxido de nitrogénio, NOx, um gás altamente nocivo para a saúde.


Apesar de nenhuma destas tecnologias ser recente, pois ambas foram descobertas há mais de duzentos anos, a verdade é que nunca chegaram a ser utilizadas na prática, além de esporádicas experiências. E mesmo os fabricantes que já testaram o hidrogénio nos motores de combustão interna, no ramo automóvel, estão actualmente a dar preferência à célula, ou pilha de combustível.

No entanto a insistência no Hidrogénio não é fácil de entender.

Primeiro, no aspecto da sua produção, o hidrogénio pode ser obtido facilmente a partir de diversas técnicas, nomeadamente a eletrólise e a gaseificação de biomassa, ambas consideradas verdes, mas recorrendo a enormes quantidades de energia, no caso da primeira e a grandes quantidades de matéria orgânica, no caso da segunda.

Mais comum é a sua produção a partir do gás natural, sendo por isso denominado de hidrogénio cinzento, pois a sua produção implica uma elevada emissão de CO2, sendo esta a forma utilizada para produzir praticamente a totalidade do hidrogénio consumido na actualidade.

Depois seguem-se os aspectos do transporte, abastecimento e armazenamento.

A distribuição do hidrogénio, tanto por via terrestre como por via marítima, vai consumir recursos e emissões de carbono, o abastecimento dos veículos que o consumirem vai ser mais complicado, obrigado a cuidados com a estanqueidade das ligações das tubagens e mangueiras e a adoptar métodos preventivos de incêndio, como a descarga de eletricidade estática dos veículos, devido ao elevado risco de deflagração apresentado pelo hidrogénio, que ainda por cima é um gás incolor, inodoro e insípido.


Para complicar, o hidrogénio à temperatura normal, seja para armazenamento, transporte ou durante o abastecimento, tem de ser mantido comprimido a uma pressão que normalmente ronda os 700 bar (10,000 psi). Por comparação, uma garrafa de gás propano tem uma pressão de apenas 6,5 bars (94 psi).

No que respeita à utilização do hidrogénio nos motores de combustão interna, o caso ainda enfrenta mais problemas. Apesar de 1 litro de hidrogénio à pressão de 700 bar ter um peso de apenas 40 gramas e de a mesma quantidade de gasolina pesar cerca de 750 gramas, a densidade energética volumétrica do hidrogénio é muito inferior à da sua oponente fóssil. Com apenas 8,5 MJ por litro, contra 32 MJ da gasolina, o hidrogénio necessita, para a mesma autonomia, depósitos quatro vezes maiores, além de capazes de suportarem a elevada pressão, temperaturas extremas e eventuais impactos em caso de acidente.

E se para os automóveis este já é um problema complicado de resolver, nas motos então… Basta reparar no protótipo da Kawasaki com motor de combustão interna a hidrogénio, que recentemente fez a sua primeira demonstração pública mundial no Circuito de Suzuka, no Japão (saiba mais nesta ligação).



Por todas estas razões, o hidrogénio dificilmente vai criar uma mobilidade de emissões zero, pelo menos num futuro próximo, apesar de aqui e ali se ouvirem notícias de protótipos ICE destinados a serem alimentados por hidrogénio, na prática ainda nenhum passou à produção.

Por seu lado, os painéis solares são cada vez mais eficazes e acessíveis e as baterias evoluem todos os dias, em termos de preço, de redução de peso e volume e aumento de capacidade. Os automóveis já as adoptaram, podendo ser consideradas um verdadeiro sucesso em termos de duração e autonomia, e com o seu desenvolvimento tornam-se cada vez mais capazes de serem integradas eficazmente nas motos e nas scooters.

Também a rede de carregamento elétrico está a crescer a olhos vistos (A MOBI.E prevê criação de mais de 76 mil pontos de carregamento de veículos elétricos até 2050).

A rede Mobi.E integra atualmente 23 Comercializadores de Eletricidade para a Mobilidade Elétrica (CEME) e 87 Operadores de Pontos de Carregamento (OPC) que disponibilizam um total de 5.167 postos e 8.367 pontos de carregamento, com 26 novos postos a serem, em média, instalados por semana em Portugal. Já ao nível do consumo de energia dos postos de carregamento, foram consumidos em Portugal, este ano de 2024 e até 30 de setembro, 48.266 MW, um aumento de 89% em comparação com o mesmo período de 2022.

E quem tiver medo de que a rede nacional não aguente o aumento previsto, a potência total, que atualmente é de 216 MW (acima do valor necessário de 195 MW), tem uma previsão de alcançar os 1.230 MW até 2030 e os 3.320 MW até 2050.

andardemoto.pt @ 21-9-2024 16:46:50 - Texto: Rogério Carmo


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