Johan Pereira

Johan Pereira

Motociclista, peregrino da liberdade.

OPINIÃO

De Portugal à Finlândia - 18º e 19º dia

28 e 29 de abril de 2024

No décimo oitavo dia a manhã fria abraçava-nos com uma nostalgia antecipada, sabendo que cada dia que passava os quilómetros até às origens diminuem.

andardemoto.pt @ 1-5-2024 17:26:03 - Johan Pereira

18º dia – 28 de abril de 2024

Abordei a funcionária do hotel, inquirindo um local onde pudesse eternizar a nossa passagem com o autocolante da viagem. Com um sorriso, ela assentiu, guiando-nos à entrada para colocar logo no vidro principal.

Ao confessar o nosso destino nortenho nesta época do ano, não pôde deixar de exclamar que éramos, de facto, uns verdadeiros malucos. Entre risadas, concordei, "Malucos é favor!", escapou-me, num tom de orgulho e loucura partilhada.

Com o GPS a marcar a distância que nos separava de Oslo, sabíamos perfeitamente que não era dia de chegarmos ao nosso destino. Contudo, estávamos decididos a seguir o caminho, alimentados pela mesma loucura que nos levou ao norte.

A meio da jornada, rendemo-nos ao apelo de um Burger King, curiosos por provar uma tarte de caramelo e maçã, uma iguaria desconhecida nos nossos cantos de Portugal. E que descoberta! Uma doçura que só encontramos em terras estrangeiras, um pequeno prazer que nos fez questionar: "Por que não temos isto em casa?"

À medida que a viagem se desenrolava, o clima decidiu pregar-nos uma partida, misturando chuva com um frio cortante. Essa combinação forçou-nos a parar em Sveg, numa noite onde tudo parecia fechado, um silêncio apenas quebrado por nós.


Decididos a não nos deixarmos abater, fizemos o nosso café ao ar livre. Com grãos acabados de moer, o ralador a trabalhar, criámos um momento mágico sob o céu noturno. O aroma do café recém-preparado parecia rir-se da nossa situação, um pequeno luxo numa noite de desventuras.

Porém, a comédia da vida quis adicionar mais uma cena ao nosso filme: após andarmos 100 metros, descobrimos que a cidade estava, afinal, de portas abertas. A estupefação misturou-se com o riso, numa gargalhada que ecoou pelas ruas vazias. "Que estupidez!", exclamámos, incapazes de conter o humor da situação.

Assim, decidimos fixar-nos em Sveg, rendendo-nos às surpresas e às voltas inesperadas da viagem. Este dia, marcado por descobertas culinárias e peripécias climáticas, reforçou a nossa certeza de que, malucos ou não, éramos viajantes em busca de histórias para contar.


19º dia – 29 de abril de 2024

No décimo nono dia, com os ponteiros do relógio a marcar as 8 da manhã, e o GPS já programado para Kristiansand, o local onde, no dia seguinte, apanharíamos o ferry rumo à Dinamarca. O céu cinzento prometia chuva, uma previsão que não tardou a confirmar. Cruzámos a Suécia debaixo de um aguaceiro incessante, mas, ao cumprimentarmos a Noruega, a chuva começou a dar tréguas.

A cerca de trinta quilómetros depois da fronteira, um grito do meu pai, pelo intercomunicador, fez-me saltar no assento. Uma rena gigantesca cruzou-se à frente dele; se não fosse pelo ABS da GS, talvez a história tivesse tido outro desfecho.

Após o susto, fizemos uma pausa para fotografar uma manada inteira delas,

Retomámos a viagem, parando mais tarde numa área de serviço em Oslo, para um merecido descanso. Ao lado, uma hamburgaria chamou a nossa atenção. Uma cena insólita desenrolou-se quando uma senhora, após comprar o seu hambúrguer, viu-se impedida de regressar ao carro por um bando de pássaros agressivos, que pareciam exigir uma taxa pela comida. A situação, hilariante, arrancou gargalhadas de todos os presentes.


Prosseguimos a viagem em direção a Kristiansand. Já passava das 23 horas, e ainda tínhamos pela frente duas horas de estrada. Com o ferry marcado apenas para as 12h30 do dia seguinte, optámos por pernoitar numa cidade próxima, Porsgrunn, para onde nos dirigimos após uma reserva de última hora. A viagem até lá durou uns breves 20 minutos.

À nossa chegada, fomos recebidos por dois paquistaneses que além de estarem visivelmente desconfiados, o veículo deles ainda mais desconfiado era. Enquanto o meu pai entrava, eu procurava os pertences de higiene na mala da mota. Pouco depois, o meu pai regressou ao exterior, chamado pelos paquistaneses que exigiam uma prova de que realmente iríamos pernoitar ali. Pediram-nos para trancar a porta e depois voltar a destrancá-la com o código que nos tinham fornecido. Cumprida a estranha solicitação, não voltámos a ver os nossos anfitriões.


Tínhamos pedido um quarto com duas camas individuais e casa de banho partilhada, mas, por algum motivo, os paquistaneses ficaram com esse e com o outro quarto para eles próprios. Contudo, numa exploração casual pela casa, descobrimos um quarto desocupado, equipado com uma cama de casal, uma individual e uma casa de banho privativa. Sem hesitar, acomodámo-nos nesse espaço, considerando-o uma pequena vitória nossa. Afinal, no meio de desconfianças e encontros inesperados, acabámos por sair a ganhar.

andardemoto.pt @ 1-5-2024 17:26:03 - Johan Pereira


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