Adelina Graça

Adelina Graça

Duas rodas, duas asas

OPINIÃO

Andaluzia – Ronda/Antequera

Depois da azáfama de Sevilha lá arranquei para Ronda. Ronda, por defeito de profissão, sempre fez parte dos meus planos, havia uma profunda vontade de visitar a ponte do século XVIII, cuja estrutura em pedra e a arquitetura são absolutamente deslumbrantes. Mas o que mais impressiona é sem dúvida os 100 metros altura, sobre o precipício e a beleza dos seus Arcos.

andardemoto.pt @ 31-5-2022 00:46:03 - Adelina Graça

Mas antes disso, não posso deixar de confidenciar a minha relação com os gadgets que me acompanham. Ao início, confesso que passei por uma fase de, ao bom e velho estilo São Tomé, “ver para crer”. Já muito tinha ouvido nas conversas de café sobre punhos aquecidos, intercomunicadores, “cruise control” (coisa de carro caro) e outros tantos acessórios, que me faziam crer que estes tipos, com tanta coisa, provavelmente até se esquecem que vão de moto.


Bem, a minha relação com gadgets revelou-se, antes de mais, uma surpresa extraordinária. A primeira coisa que coloquei na moto foram os punhos aquecidos, confesso que fiquei de imediato fã, talvez pelo simples facto de começar a sentir as mãos no inverno. Sim, afinal tinha mãos, e se bem me lembro, naquelas tiradas de inverno, com os dois pares de luvas que me deixavam pressentir (se tanto) a embraiagem, o travão e o acelerador, era basicamente uma proteção para os primeiros 10 kms depois, depois deixava de as sentir novamente...


O aquecimento dos punhos é daquelas coisas que se assemelha ao aquecimento das casas nos países nórdicos, funciona mesmo…


A partir desse dia, passaram a andar sempre ligados, mesmo que estejam uns 30 graus, para recuperar dos dias em que tinha de colocar as mãos no escape para as voltar a sentir, coisa que já vinha desde os bons e velhos tempos da Yamaha RZ 50.


Depois dos punhos, o intercomunicador, foi amor à primeira nota, a primeira vez que coloquei o capacete e ouvi a “Desireless” cantar o “Voyage Voyage” pensei uau, isto é mesmo bom “ne t ́arrêt pas” sim, bem ao estilo dos saudosos saloios anos 80.


Depois desse dia o meu telemóvel não teve mais descanso, acho que neste momento tenho música para dar três voltas ao mundo. Só que o raio do aparelhinho tem uns botões que nunca percebi bem onde eram, com dois pares de luvas achá-los no capacete é obra de cirurgião. Felizmente, descobri que havia um comando remoto que se colocava no guiador e “Voilá” é só mudar de faixa e subir o som, que absoluta maravilha!


Quanto ao “cruise control” não falarei nele porque, como não tenho, sempre que vejo um amigo em AE a descansar as mãos, passa-me pela cabeça colocar-lhe um pau nos raios... Ronda é uma cidade maravilhosa que vale mesmo a pena visitar, sobre o precipício “el Tajo de Ronda” a vista é deslumbrante.

Depois do almoço, de marmita, com o olhar sobre o infinito desfiladeiro, ao estilo restaurante “gourmet” mas sentada em mini banquinho de campismo com a lancheira no colo, lá arranquei para “el corazón de Andalucía”, a caminho da Serra Nevada.

Depois de tanto andar a direito, lá chegaram as curvas que qualquer motard anseia, foi um bálsamo. Com as montanhas que já se vão avistando e as estradas mais rústicas, cheguei a Antequera, confesso que já me doíam as “cruzes” já contava 300 klms, a cidade é linda, com um centro histórico repleto de monumentos seculares, coroados pelo castelo e a basílica de Santa María.

Confesso, no entanto, que por muito deslumbrante que são todos aqueles edifícios, a pastelaria com ar de guloseima foi a minha primeira paragem, estava bastante cansada e não resisti. Moto parada à porta da dita e uma bela guloseima que me soube que “nem ginjas”.

Estava eu ainda a tentar perceber se aquilo era fome ou gula, a cada dentada, quanto ouço um “menina aquela moto é sua?” da senhora que tão agradavelmente me servira o bolo.

“Sim é”

“Uau, de onde vem, para onde vai, como chegou aqui...”


São momentos de carinho que me adoçam o dia, mais do que qualquer bolo, é um bálsamo para a alma. Apesar das dores nas cruzes, lá me levantei para mostrar a rodas altas e explicar como é bom andar de mota, aventuras e desventuras.

Depois disso, comprei uma “baguette” gigante para o jantar e uma boa garrafa de vinho para as dores nas cruzes (resulta sempre) que prendi à mala, porque, como já expliquei, as minhas malas vão cheias de coisas que sou “capaz de vir a usar” e não cabe mais nada.

Felizmente, o Hotel Manzanito era ali, bem no centro da cidade, frente à paróquia de S. Sebastian, muitíssimo agradável e com todas as comodidades. Depois da mota acorrentada e arrasto de bagagem até ao quarto, lá fui eu para o bem merecido duche e para um jantar refastelado no pátio interior do hotel. Outro gadget que não dispenso nestas viagens é a minha velha coluna de som que, ao final do dia, me faz baixar as rotações e fazer um “reminder” do dia, daquela curva mais fechada, da paisagem, do tipo que não queria deixar ultrapassar, da vista deslumbrante sobre o desfiladeiro, do susto... Enfim, um jantar ao som inebriante da paixão pelo mundo das motos.

Depois, um passeio até ao esplendoroso castelo altaneiro, demasiado altaneiro, tantas escadas, um verdadeiro deslumbre da cidade sob uma noite de lua cheia, ao bom estilo lobisomem, com a luz lunar a passar pelas frestas da alcazaba do Castelo e as luzes que se espalham por todo o vale profundo.




As flores, que orgulhosamente tomaram conta dos parapeitos das janelas e enfeitam as paredes gastas pelo tempo, as ruas, que se entrecruzam como linhas pelo vale e que se penduram sobre o majestoso castelo, e as pequenas laranjeiras, que se alinham nas ruas, dando cor, alegria e mediterrânio a todo aquele estilo Barroco da “Florença de Andaluzia” a fazer sonhar com lendas e fábulas Mouras.


andardemoto.pt @ 31-5-2022 00:46:03 - Adelina Graça


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