Susana Esteves

Susana Esteves

Jornalista e motociclista

OPINIÃO

O vírus do motociclista virgem

Comportamento impulsivo, febre, ansiedade, obsessão e sentimentos de dependência. Estes são apenas alguns dos sintomas causados por este vírus. Não é mortal, mas pode causar danos a médio prazo, nomeadamente à conta bancária. Vacina? Ainda não há.

andardemoto.pt @ 14-7-2019 09:00:00 - Susana Esteves

Quando entramos no mundo do motociclismo compramos uma 125 ou no máximo uma 300 (uma aventura). No início o bicho parece grande, sentimos que temos que o domar e mostrar quem manda, antes que ele “cheire” o nosso medo e nos amanse. Os planos de vida são quase sempre muito semelhantes:

- Vou comprar uma 125, aproveitar durante uns anitos e depois logo se vê. Para o que eu preciso isto chega, mais tarde depois arranjo algo maior. 

Sabemos que estamos infetados com este vírus quando, depois de poucos meses, sentimos que o garanhão de 125 cc começa a parecer um pónei de feira, daqueles que passeia as criancinhas. Ou quando começamos a olhar (ou babar) para as motas um pouco maiores e pensamos: “Eu ficava bem ali. E se trocasse?”


Em poucos segundos começamos a arranjar argumentos que justifiquem a nova compra – tudo desculpas completamente inválidas, mas que nos ajudam a explicar o porquê de comprarmos 2 motas no espaço de 4 meses.

- “Gasta menos.” “É melhor para as costas.” “É mais segura.” “Consigo meter-lhe uma mala maior”. “Tem mais 5 cavalos e até traz um relógio”…

É o chamado vírus galopante (perigosíssimo). Poucas horas depois deste momento de introspeção já fomos à Net ver modelos, preços, fazer comparações e já adiantámos trabalho para sair mais cedo e passar pelo stand. Antes de chegarmos a casa já está tudo feito. Mota nova a caminho – linda, fantástica, maior (mas não muito, para não me meter em aventuras).

Mas este é um vírus tramado. Sem medicação adequada volta quando menos esperamos. A novíssima 500 cc que era perfeita há 5 meses começa a ter defeitos. Parece perder potência, encolher, ficar aquém. “Aquela desportiva é que era! Podia vir trabalhar e passear ao fim de semana. Assim gastava dinheiro, mas ficava servido para os próximos anos.”

Hummmm, talvez não. Os novos modelos são giros, o gosto pelo pormenor aumenta, a carne é fraca…


Existem muitos motociclistas virgens que não resistem à tentação de terem várias parceiras no primeiro ano (se calhar devia acrescentar promiscuidade à lista de sintomas). A sensação de querer mais, melhor, maior ou simplesmente diferente é muito forte, e as trocas constantes são perfeitamente comuns (podiam era ser mais espaçadas, não há carteira que aguente). À medida que vamos ganhando pulso, o nível de exigência vai aumentando, o gosto vai ficando cada vez mais refinado e começamos a desenhar as preferências. Entretanto os amigos começam a questionar a nossa sanidade mental, ou a colocar a hipótese de nos ter saído o 2º prémio do Euromilhões.

O que trava este vírus? Talvez a carteira, a idade, ou o facto de encontrarmos a marca ou o modelo perfeito. Pessoalmente acho que é uma doença sem cura. O “bicho” pode ficar adormecido durante uns tempos, mas eventualmente vai voltar.

Boas curvas

andardemoto.pt @ 14-7-2019 09:00:00 - Susana Esteves


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