
Susana Esteves
Jornalista e motociclista
OPINIÃO
As regras são para…
Por muito cumpridores que sejamos no trânsito, em cima de uma mota ou ao volante de um automóvel, é impossível não quebrarmos ou contornarmos as regras de vez em quando. Muitos fazem-no de forma consciente, seja por que razão for, mas muitos quebram as regras por desconhecerem a lei. Partimos do princípio que quem anda na estrada tem que saber o bê-á-bá da legislação em vigor, mas isto só acontece no mundo perfeito.
andardemoto.pt @ 20-11-2017 18:00:21 - Susana Esteves
As regras mudam, as pessoas ficam presas ao “antigamente era assim”, as escolas de condução muitas vezes fazem uma espécie de interpretação livre (e criativa) da lei e acabam por passar a mensagem errada aos alunos, os anos de experiência criam muitas vezes os chamados Ases do Volante que acabam por revelar-se os mais irresponsáveis na estrada, mas o mais grave é que vivemos numa sociedade de contra informação.
Quando temos dúvidas sobre uma regra ou lei perguntamos a um amigo, a um familiar, ao Google ou ao suposto “guru” do grupo. E daqui advêm dois possíveis resultados: ou temos sorte e ficamos bem informados, ou essa pessoa ainda sabe menos que nós e dá-nos a informação errada.
No universo motociclista existem algumas dúvidas com lugar cativo nas conversas de café, que geram sempre respostas diferentes. Como sou habitualmente daquelas que se mantém prudentemente calada nestes momentos (para não dizer asneira), fui à procura de respostas para algumas delas.
- É permitido andar numa estrada como o IC 19 entre os carros com sinalização de ultrapassagem?
No Código da Estrada, “Via de trânsito” é toda a zona longitudinal da faixa de rodagem destinada à circulação de uma única fila de veículos. Ou seja: Não!
- E a ultrapassagem sinalizada pela esquerda na mesma faixa onde circula a outra viatura?
Só é permitida desde que efectuada numa via de trânsito diferente, conforme indica a resposta anterior. Ou seja: Também não!
- É permitido a uma mota estacionar num local com parquímetro?
A paragem e o estacionamento devem fazer-se nos locais autorizados e sinalizados pelo sinal vertical H1a (Parque). Se este sinal estiver acompanhado do sinal adicional 11ª, então o espaço permite apenas o estacionamento a veículos ligeiros.
É um sinal que está presente habitualmente em zonas com parquímetros. Os locais exclusivamente destinados a motociclos estão identificados com o sinal adicional 11f. Na faixa de rodagem, o estacionamento deve ser feito o próximo possível do respetivo limite direito, paralelamente a este e no sentido da marcha. Resumindo: podes esquecer a piada do: “E onde é que pomos o ticket?”
- As alterações efetuadas nas motas (escapes, punhos, bancos, guiadores) são permitidas? Até que ponto uma alteração tem que constar do documento da mota?
É proibido o trânsito de veículos que disponham de sistemas, componentes ou acessórios não aprovados. Todos os sistemas, componentes e/ou acessórios de um veículo são considerados suas partes integrantes, e como tal estão sujeitos a aprovação de acordo com as regras fixadas.
- Quais são estas regras?
Essa é outra temática para outro artigo. Recentemente o número de veículos que transitam com peças “não aprovadas” tem aumentado pelo facto de muitas delas serem adquiridas "on-line", onde há mais oferta e preços mais baixos. Neste caso, convém garantir que está em conformidade com o regulamento.
- O prazo de validade dos capacetes é algo que pode ser fiscalizado e punível se estiver ultrapassado?
A validade dos capacetes pode ser fiscalizável, mas não está até ao momento prevista punição para os motociclistas que circulem com capacetes com validade ultrapassada. No entanto a recomendação é para que esse prazo seja respeitado.
Quando um capacete cai ou está envolvido num acidente, a sua fiabilidade/resistência também fica seriamente comprometida.
O mesmo acontece com a sua utilização prolongada, que dá origem a uma diminuição da altura das esponjas e do material de amortecimento, e um aumento da folga, o que não é aconselhável! Além do mais, a resistência e eficácia dos materiais que garantem a nossa segurança vai ficando debilitada ao longo dos tempos!
- A condução de motociclos de saia, tronco nu e chinelas de praia, é proibida?
No código da estrada não está estipulada qualquer norma que proíba a condução de motociclos das formas indicadas. As recomendações dizem apenas que os condutores devem, durante a condução, abster-se da prática de quaisquer atos que sejam suscetíveis de prejudicar o exercício da condução com segurança. Além disto, (o mais importante neste caso), os condutores não podem pôr em perigo os utilizadores vulneráveis, isto sim, previsto no código da estrada art.º 11.º, nº 2 e 3.
- É punível a condução com o capacete desapertado?
Sim, os condutores e passageiros de ciclomotores, motociclos com ou sem carro lateral, triciclos e quadriciclos devem proteger a cabeça usando capacete de modelo oficialmente aprovado, devidamente ajustado e apertado, conforme previsto no C.E. art. 82.º, nº3.
- É proibido transportar mochilas de mota e/ou equipamento protegido por redes elásticas?
A lei não é muito específica. O artigo 92.º do código da estrada diz que o transporte de carga em motociclo, ciclomotor ou velocípede só pode fazer-se num atrelado ou caixa de carga, e que é proibido aos condutores e passageiros dos veículos referidos transportar objectos susceptíveis de prejudicar a condução ou constituir perigo para a segurança das pessoas e das coisas ou embaraço para o trânsito.
Quem infringir o disposto nos números anteriores é sancionado com coima de 60 a 300 euros. Se uma mochila pode, ou não, prejudicar a segurança acho que depende da interpretação e/ou da mochila. Existem opções criadas especificamente para motociclistas que são extremamente confortáveis e que ficam justas ao corpo, o que minimiza o impacto do vento e nas curvas. Sacos do supermercado no guiador, bolas de futebol entre as pernas, guarda-sol às costas é que se calhar é abusar um pouco…
- É permitida a utilização de viseiras escuras nos capacetes?
Apesar de a resposta certa para questão 515 do exame de código para carta de mota - “A cor da viseira do capacete de um motociclista deve:” – ser “A clara pois as outras não são autorizadas”, a verdade é que não é bem assim!
O Código da Estrada não refere nada sobre viseiras nem sobre as características do capacete, referindo apenas que o modelo deve ser oficialmente aprovado. Ou seja, assumimos nós, que um capacete aprovado que integre já uma viseira mais escura deve ser legal.
- Mas quais são as regras de homologação seguidas?
O Regulamento n.º 22 da UNECE sobre disposições uniformes relativas à homologação de capacetes de protecção e viseiras diz que: “As viseiras devem ter uma capacidade de transmissão luminosa tv ≥ 80% relativamente à norma de iluminação D65. São permitidas também viseiras com uma transmissão de 80% > tv ≥ 50%, com a indicação «DAYTIME USE ONLY».
Diz ainda que: “As viseiras devem ser suficientemente transparentes, não causar distorções significativas de objectos, devem ser resistentes à abrasão, resistentes ao choque e não devem contribuir para qualquer confusão com as cores utilizadas na sinalização e nos sinais.” Neste caso, esta informação é importante para quem quer adquirir viseiras extra, espelhadas ou mais escuras, que podem fazer parte dos acessórios do capacete, mas não serem permitidas em Portugal.
Existem inúmeras questões pendentes, umas mais pertinentes que outras consoante o grau de experiência e o nível de informação dos motociclistas. Também não existem respostas certas para algumas delas. A lei por vezes generaliza e deixa a porta aberta a várias interpretações. Se optarmos por contornar uma ou outra regra, é importante que o façamos de forma consciente, porque cometer erros por desconhecimento das regras é a pior postura que existe.
Afinal as regras são para … cumprir!
Elas existem para garantir uma maior segurança na estrada, mas também não vale a pena vivermos na ilusão que todos as vão seguir.
Este artigo foi feito com a prestável colaboração do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP – Divisão de Trânsito, que por também não acreditar no mundo perfeito, sublinhou várias vezes a importância de uma condução responsável que não coloque em perigo a vida das pessoas. Se tiver que contornar algumas regras, mantenha a segurança sempre em primeiro lugar
Boas curvas
andardemoto.pt @ 20-11-2017 18:00:21 - Susana Esteves
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