
Paulo Araújo
Motociclista, jornalista e comentador desportivo
OPINIÃO
As gloriosas 350
De entre as classes
desaparecidas do Mundial, a de 350cc, extinta em 1982, deixou-nos algumas das mais
emblemáticas motos de corrida de todos os tempos, pilotadas por nomes famosos.
andardemoto.pt @ 9-8-2017 10:49:51 - Paulo Araújo
Até o início dos anos 80, o Mundial de Velocidade, agora profissionalizado e condicionado num pacote conveniente de horários em nome do deus televisão, tinha muito mais categorias do que as 3 agora existentes: Moto3, Moto2 e MotoGP.
Havia as pequenas 50 (depois 80, antes de também elas desaparecerem ), as 125cc a dois tempos que se tornaram em 250cc a 4 tempos, ou Moto3, as 250 2T que se tornaram em 600 4 tempos e Moto2 e as 350vv, além das 500 que hoje, já a 4 tempos, são a classe rainha de MotoGP.
Havia também sidecars e uma breve tentativa de instalar uma Formula 750, abandonada ao fim de um par de anos por as motos serem perigosas demais para os limites da tecnologia da época, nomeadamente os pneus. Dessas, falaremos um dia mais tarde. Hoje, quero-vos falar da desaparecida 350cc.
Pela classe passaram, nos primeiros anos do Mundial, nomes famosos como Surtees, Duke ou Redman, e nacionalidades algo exóticas como Rodésia ou Niasaland, embora entre o seu começo, em 1949, e 1961 a classe fosse dominada por Ingleses.
As razões que depois levaram ao desaparecimento das 350 são muitas: Estava a ficar difícil acomodar todas as classes, com treinos livres, treinos cronometrados, corridas, pódios e tudo o resto, nos tempos em que a cronometragem ainda era feita à mão. Também, sendo muitos os pilotos amadores, a comparência aos treinos de sexta-feira, quanto mais aos de quinta (sim, também havia treinos à quinta-feira!) podia ser um problema.
Por outro lado, a bolsa de prémios necessária, pagando até ao 25º classificado, tornava difícil atrair novas organizações. E mesmo para as existentes, era muito difícil manter as provas de ano para ano.
Se em países como a Inglaterra, Holanda ou Checoslováquia os números de espectadores eram massivos (esta última, justificada por ser uma rara oportunidade dos habitantes da cortina de ferro contactarem um evento internacional), outras como Anderstorp na Suécia, Spa na Bélgica ou Montjuich em Espanha tinham mais dificuldades.
Depois, as classes eram muito semelhantes, além da cor das placas, pouco as diferenciava, e as 350 eram um meio-termo sempre ingrato, pouco mais rápidas que uma 250cc bem guiada, mas menos espectaculares que as já na altura espectaculares 500cc...
A classe também tinha tendência a ser dominada anos consecutivos pela fábrica que a ela se dedicasse, mais uma vez tirando algum interesse às corridas: Por exemplo, entre 1953 e 1957 a Moto Guzzi dominou, e sucedeu-se o mesmo com a MV Agusta entre 1958 e 1961, e depois entre 1968 e 1973, desta última feita exclusivamente com Giacomo Agostini, que para mais também se sagrou Campeão das 500 em todos esses anos menos 1973...
Já está a ver como a confusão e falta de interesse na classe se começou a instalar?
Em 1974, chegaram os japoneses, e começa, talvez, o período de ouro, ou antes o canto do cisne das 350...
Técnica e comercialmente, havia vantagens para as fábricas em manterem uma classe de 350... havia numerosas motos de estrada com essa cilindrada para fazer o público sonhar, desde as Inglesas como a Norton, Velocette, Triumph, AJS, etc. às outras europeias como a Ducati ou Moto Guzzi, e todas as marcas japonesas tinham uma moto de 350cc, da pacata Honda a 4 tempos às ferozes Yamaha ou Kawasaki, derivadas de muito perto das motos de competição da época...
Também, aumentando ligeiramente o diâmetro ou curso de uma 350, obtinha-se uma 395, útil para os privados participarem nas 500 com uma moto barata e mais competitiva que as datadas Norton Manx...
Dobrando a cilindrada de 350, com um motor com mais cilindros, obtinha-se uma 700, dai o aparecimento da referida classe 750cc uns anos depois...
Seja como for, quando os japoneses apareceram na categoria, que correspondeu ao aparecimento a sério das motos a 2 tempos no Mundial, as coisas aqueceram: de repente, em vez de um verdadeiro pelotão de velhas Norton Manx a competir com o poderio e o dinheiro do Conde Agusta e das suas Meccanica Verghera a 4 tempos, havia alternativas reais chamadas, pelo menos, Yamaha e Kawasaki.
A fábrica da cor verde interessava-se particularmente por esta categoria, e se pouco depois inventaram o termo “Jet Ski”, é porque o motor usado nestes era directamente derivado do dois-em-linha usado pela marca nas 350cc.
Fosse como fosse, Agostini tinha mudado para a Yamaha e ganho logo em 1974, e quando apareceu um sensacional jovem venezuelano, de nome Johnny Cecotto, o título permaneceu mais um ano nas mãos da casa de Ywata.
Chega então o que muitos chamam a “aventura europeia” da Harley-Davidson, que com a sua adquirida Aermacchi e um determinado piloto, Walter Villa, consegue inverter, ainda que momentaneamente, em 1976 apenas, o domínio das 2 tempos que já se vinha anunciando...
Porém, são os anos seguintes que muitos recordam como o período de ouro das 350: A chegada da Kawasaki, com um pacato Sul-Africano chamado Hugh Neville, mas mais conhecido por “Kork” Ballington.
Esta provou ser uma dupla imbatível entre 1977 (quando um emigrante Coreano no Japão de nome Katayama deu mais um título à Yamaha antes de passar às 500cc) e 1980, quando mesmo assim, foi outro Sul-Africano a levar o título, Jon Ekerold, desta numa Yamaha, mas com ciclística Bimota. Uma destas motos chegou mesmo a Portugal pouco tempo depois.
A Kawasaki ainda tinha uma palavra a dizer, pela mão dum dos mais frios e calculistas pilotos do Mundial, o imperturbável alemão Anton Mang, que era um mestre na leitura das fraquezas dos seus adversários, e que conquistou os derradeiros títulos da classe em 1981 e 1982. Por isso é, justamente, conhecido como o último Campeão Mundial de 350!
andardemoto.pt @ 9-8-2017 10:49:51 - Paulo Araújo
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